ARTIGO | ‘CHOCOGATE’ DE FLÁVIO BOLSONARO MANCHA AINDA MAIS A IMAGEM DE MORO
Célebre por desvendar casos de lavagem de dinheiro, ministro evita os fortes indícios contra o filho 01, mas continua palpitando em favor do presidente
Luiz Fernando Vianna
29/12/2019 - 16:18 / Atualizado em 29/12/2019 - 18:00
Destacou-se, na semana que passou, a grande derrota que Sergio Moro sofreu dentro do próprio governo. Ao contrário do que o ministro da Justiça e Segurança Pública desejava, Jair Bolsonaro não vetou a figura do juiz de garantias, incluída por deputados federais na chamada lei anticrime.
A novidade prevê que dois magistrados dividam um processo penal. O primeiro, que é o juiz de garantias, acompanha a investigação criminal, decidindo sobre mandados de busca e apreensão, prisões provisórias e quebras de sigilo, além de – ao menos na teoria – cuidar para que não haja violação de direitos. Ao segundo cabem as sentenças.
Fica mais difícil repetir o que, como hoje se sabe, aconteceu na Lava-Jato. Moro orientava a força-tarefa do Ministério Público a obter provas que ele, depois, usaria para condenar os réus. Atuou como parte da acusação. Prisões preventivas foram usadas para forçar pessoas a delatar. E delações e grampos se tornaram públicos ao sabor dos interesses do único juiz do processo, Moro.
É possível, como tem sido aventado, que a decisão do presidente indique sua esperança de que as investigações sobre seu filho Flávio não fiquem exclusivamente nas mãos do juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal do Rio de Janeiro.
Decisões do magistrado vêm permitindo a coleta de informações que reforçam o cerco contra o hoje senador. Há fortes indícios de que, quando deputado estadual no Rio, ele praticava a “rachadinha”. Ou seja, ficava com parte dos salários dos assessores, muitos provavelmente fantasmas. O operador do esquema seria o ex-PM Fabrício Queiroz, que, muito antes de virar braço direito do filho 01, trabalhava para o pai, Jair Bolsonaro.
O material reunido pelo Ministério Público do Rio de Janeiro aponta que a lavagem do dinheiro oriundo da “rachadinha” passaria pela loja de chocolates que Flávio tem num shopping da Barra da Tijuca.
O quadro desenhado acima não fica completo se não for assinalado que o “chocogate” é nova mancha na imagem de Moro. Sua fama foi conquistada ao longo de um processo que revelou como se dava a lavagem de recursos nos governos petistas. O nome da operação, Lava-Jato, nasceu por conta de um posto de gasolina de Brasília que era usado no esquema. Moro, que conhece a fundo os caminhos para dar ares de limpo a dinheiro sujo, mantém-se num governo em que o filho do presidente está enroladíssimo num caso de lavagem. É claro que vale o benefício da dúvida, mas há cada vez mais benefícios do que dúvidas.
O processo corre na primeira instância, no Rio de Janeiro. Não há por que o ministro da Justiça dar palpite. O problema é que, para defender o chefe, Moro vem emitindo opiniões que não combinam com o cargo que ocupa.
São vários os exemplos, mas fiquemos em dois de outubro passado.
Após reportagem da Folha de S. Paulo sobre candidaturas laranjas do PSL – partido pelo qual Bolsonaro se elegeu em 2018 – em Minas Gerais, o ministro escreveu nas redes sociais: “O presidente Jair Bolsonaro fez a campanha presidencial mais barata da história. (...) Nem o delegado nem o Ministério Público, que atuam com independência, viram algo contra o presidente da República neste inquérito de Minas”.
Mais do que agir como advogado-geral da União, o que já seria uma impropriedade (a investigação não é contra a União, mas sobre um possível delito eleitoral), Moro atuou como defensor particular de Bolsonaro.
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