quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

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A reação dos governadores

Diante da impossibilidade de debate político e técnico com o presidente Jair Bolsonaro, começa a se articular uma defesa do pacto federativo para fazer frente aos desmandos do governo federal e preservar a autonomia dos estados

Crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Os governadores se articulam para defender o 
pacto federativo e se contrapor à vontade autoritária
 e às manobras diversionistas do presidente 
Jair Bolsonaro e de seus filhos. O último impulso
 para perturbar a delicada relação entre estados
 e União veio com a morte do miliciano Adriano
 da Nóbrega, em Esplanada, na Bahia, que deixou
 forte suspeita de execução. Enquanto tenta de se
 desvencilhar de sua longa amizade com Nóbrega,
 Bolsonaro afirmou que o governador baiano,
 Rui Costa (PT), “mantém fortíssimos laços com 
bandidos” e que foi “a PM da Bahia, do PT, que
 matou o miliciano”. Em uma carta divulgada na 
segunda-feira 17, e assinada por 20 governadores,
 criticou-se a postura de confronto do presidente 
e sua intenção de se antecipar às “investigações 
policiais para atribuir graves fatos à conduta da
 polícia e seus governadores”. Os signatários 
afirmaram que as declarações de Bolsonaro
 “não contribuem para a evolução da democracia
 no Brasil”.
O crime, que ganha conotações cada vez mais

 macabras, com a indefinição sobre o destino do 
cadáver de Adriano e a divulgação pelo filho 01
 do presidente Flávio Bolsonaro (sem partido/RJ) 
de um vídeo da autópsia num corpo que seria 
do miliciano, ainda está longe de um esclarecimento.
 Rui Costa criticou a postura de Flávio e disse 
que o vídeo é falso. “Aquilo não é nem do IML
 da Bahia, nem do IML do Rio”, afirmou. A iniciativa
 de fazer a carta com críticas a Bolsonaro partiu 
dos governadores Wilson Witzel, do Rio, 
e João Doria, de São Paulo, mas contou também
 com a assinatura de governantes que apóiam
 o presidente, como Carlos Moisés, 
de Santa Catarina, eleito pelo PSL. 
Em 2018, quando foi eleito, Bolsonaro contava
 com o apoio explícito de 15 dos 27 governadores.
 Essa base de apoio, porém, está se desfazendo
 a olhos vistos.
Falta de diálogo
Ao longo da semana, Doria, durante um encontro
 com Witzel e Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul,
 cobrou um estreitamento do diálogo com Bolsonaro,
 a quem acusou de só fazer ataques e se manifestar
 pelo Whatsapp para governar. “O presidente deve
 dialogar, deve propor o diálogo com 
os governadores”, disse Doria.
 “Nós não entendemos o governo partidarizado,
 com ideologias ou com princípios que não 
respeitam a democracia como um todo”. 
Numa tentativa de pacificação da relação,
 Bolsonaro foi convidado a participar do 
próximo encontro do Fórum dos Governadores, 
dia 14 de abril.
Os problemas entre Bolsonaro e os governadores
 estão se acumulando e ganharam contornos de crise.
 No início do mês, o presidente, no contexto da
 reforma tributária, desafiou os governadores a 
zerarem o ICMS dos combustíveis, numa atitude
 oportunista e precipitada. Sem que houvesse
 qualquer discussão aprofundada, Bolsonaro
 declarou que zeraria o imposto federal sobre
 os combustíveis se os governadores fizessem
 o mesmo com o ICMS, principal fonte de receita
 para os estados. “Está feito o desafio aqui agora.
 Eu zero o federal hoje, eles zeram o ICMS. 
Se topar, eu aceito”, propôs com ar de bravata.
 Outro golpe contra a vontade política dos
 estados apareceu na semana seguinte, 
quando o presidente descartou a representação 
dos governos estaduais no recém-criado
 Conselho da Amazônia, comandado pelo
 vice-presidente, Hamilton Mourão.
Apesar da elevação da tensão política, 
a união dos governadores representa um 
sopro de vitalidade da democracia.
 Enquanto Bolsonaro não toma qualquer
 medida que seja de fato benéfica para toda
 a população, fala muito e fica minando as bases
 institucionais na educação, na saúde, na cultura 
e na polícia, os governadores reivindicam um 
maior debate sobre políticas públicas. “Equilíbrio,
 sensatez e diálogo para entendimentos na pauta 
de interesse do povo é o que a sociedade espera
 de nós”, disseram os governantes estaduais na carta.
 Com a oposição esfacelada e sem forças para 
enfrentar o governo, a defesa do pacto federativo
 talvez seja a melhor saída para preservar
 a autonomia dos estados e enfrentar a sanha
 autoritária e a incontinência verbal do presidente.


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