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quinta-feira, 27 de agosto de 2020

A FONTE DA INFORMAÇÃO FATO A FATO.COM :

Na busca por ouro, padre gastou R$ 1,3 milhão em projetos de mineração


O dinheiro gasto pertencia oficialmente 

à Associação Filhos do Pai Eterno

(Afipe), entidade criada e presidida

 pelo próprio religioso 

até a semana passada

Alvo principal da Operação Vendilhões, deflagrada
 na última sexta-feira (21), padre Robson é investigado
 por crimes de apropriação indébita, lavagem de dinheiro, falsificação de documentos, sonegação fiscal e associação criminosa. (Foto: Reprodução)
O padre Robson de Oliveira Pereira, de 46 anos, estava
 literalmente em busca de ouro. Desde 2013, já investiu 
R$ 1,3 milhão em projetos de exploração de possíveis jazidas
 no território de Goiás, de acordo com o cálculo realizado 
pelo Ministério Público do Estado.

O dinheiro gasto pertencia oficialmente à Associação Filhos do Pai
 Eterno (Afipe), entidade criada e presidida pelo próprio
 religioso até a semana passada, quando deixou o cargo
 ao se tornar o protagonista de uma série de denúncias 
apresentadas pelos promotores.

A Afipe soma nove processos abertos à espera de concessões
 para a atividade de mineração de ouro e níquel. A entidade
 busca o aval para exploração em terras situadas nos municípios
 goianos de Niquelândia, Iporá, Campestre de Goiás e Trindade.

Com a fama impulsionada pelas investidas como cantor e 
apresentador de TV, padre Robson é apontado pelo MP como 
líder de uma organização criminosa que desviou, no mínimo,
 R$ 60 milhões em doações de fiéis. Com os recursos 
mencionados pelos promotores, a Associação sob controle
 do religioso adquiriu imóveis como, por exemplo, uma casa
 de praia na Bahia.

Além da meta de garimpar ouro e níquel, a Afipe abriu
 processos para conseguir uma autorização que permitisse 
explorar economicamente a mineração de granito, argila e
 quartzito. Ao todo, são 13 procedimentos instaurados 
na Agência Nacional de Mineração (ANM).

Apesar do investimento já concretizado, até o momento
 nenhum dos processos resultou na permissão para iniciar 
a atividade com finalidade comercial.

Os recursos minerais são patrimônio da União, de acordo 
com a Constituição Federal, e a exploração econômica ocorre 
por meio de uma concessão. Para se tornar um
 concessionário, o interessado deve primeiramente realizar um 
estudo. Dos 13 processos abertos pela Afipe, 12 ainda
 estão nesta etapa.

Entre eles, os nove processos para exploração de ouro.
 De acordo com a ANM, na fase de autorização de
 pesquisa “são executados os trabalhos voltados à definição
 da jazida, sua avaliação e a determinação da exequibilidade
 de seu aproveitamento econômico”. Isso significa que
 é permitido lavrar apenas em pequena quantidade e
 com intuito de verificar se o investimento vale a pena.

Em um desses procedimentos, a Afipe recebeu multa 
por iniciar os trabalhos de pesquisa sem ter comunicado
 ao órgão regulador. No total, as áreas nas quais a entidade
 pretende fazer mineração de ouro somam 11,4 mil hectares.

PADRE PREFERIU NÃO TER SÓCIO

Na Associação Nacional de Mineração, o processo aberto
 pela Afipe que está mais adiantado destina-se a extração
 de granito no município de Iporá, localizado a 226
 quilômetros de Goiânia. O procedimento entrou em
 fase final, de requerimento de lavra, após a aprovação 
do relatório de trabalho de pesquisa.

O avanço nesse processo deve-se a participação da
 Mineração GNB, uma das empresas do grupo Edem Projetos. 
A empresa ainda aparece como uma das titulares do requerimento
 de lavra, ao lado da Afipe, mas alega ter vendido os direitos 
de exploração para a entidade religiosa, que seria a responsável 
por todo o projeto.

“Nós estamos há mais de 30 anos no mercado e temos 
uma linha de trabalho com rocha ornamental. Então escolhemos
 uma área, fizemos o requerimento de pesquisa e éramos os
 titulares do direito minerário. A empresa já tinha finalizado
 os estudos quando nós fomos procurados pelo pessoal 
da Afipe, que estava interessado em investir em mineração,
 e acabamos vendendo os direitos para eles”, disse o geólogo 
Luiz Vessoni, diretor da Mineração GNB. 

No acordo de venda, a empresa ainda ficou responsável por fazer
 o projeto de aproveitamento econômico da área de 548,89 
hectares. A venda dos direitos minerários ocorreu há cerca 
de três anos, de acordo com o geólogo. Ele alegou sigilo
 contratual para não informar o valor do negócio.

“Queríamos ser parceiros, era a nossa intenção. 
A Afipe tinha dinheiro para investir e nós acreditamos
 que Goiás é um estado que deveria ter um parque 
industrial de rocha ornamental. Então seria uma ótima parceria. 
Mas eles não quiseram parceiros, resolveram tocar sozinhos, 
compraram os direitos e acabou. Está 100% transferido
 e não temos relação alguma. Nunca mais eu vi o padre”,
 afirmou o geólogo.

Há ainda um processo que pede autorização para extrair 
quartzito em Trindade e outro para exploração granito 
e argila em Campestre de Goiás. Este último está 
em fase de licenciamento, mas no processo consta uma 
multa por início dos trabalhos de pesquisa sem 
comunicar a ANM.

ASSOCIAÇÃO DE RELIGIÃO E MINERAÇÃO

Os dados do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica, 
da Receita Federal, mostram que a Afipe está cadastrada
 para atuar como associação de defesa de direitos sociais, 
cultura e arte. E também para desenvolver atividades de 
apoio à educação, rádio, televisão aberta e comércios 
varejista e atacadista.

Mesmo assim, a entidade destinou parte dos recursos
 que arrecada com doações para a área de mineração.
 De acordo com o MP, a conselheira-fiscal da Afipe,
 Celestina Celis Bueno, destinou ao menos R$ 1,3 milhão
 em pagamentos para bancar as atividades mineradoras
 da associação religiosa.

Celestina foi funcionária da Afipe por quatro anos e
 ganhava salário de R$ 1 mil. Em 2014, ela tornou-se 
sócia de três rádios, sendo que uma delas recebeu mais 
de R$ 90 milhões da entidade no período investigado pelo
 MP, de 2010 a 2020. Depois que saiu das rádios,
 Celestina recebeu R$ 4 milhões por sua parte nas empresas.

O advogado Pedro Paulo de Medeiros, defensor 
do padre Robson, afirmou que o estatuto da Afipe permite
 a atuação no ramo da mineração. E acrescentou que não
 há sociedade com a empresa Mineração GNB.

“A defesa teve acesso ao inquérito próprio apenas agora. 
Tão logo os advogados acessem todas as suposições do
 Ministério Público do Estado de Goiás, as informações
 necessárias serão esclarecidas. O padre Robson é o maior 
interessado na verdade e na transparência, tanto que já 
solicitou ao MP que seja ouvido, o que não foi agendado 
ainda”, disse o advogado.

CASO DE EXTORSÃO CHAMOU ATENÇÃO DO MP

O padre passou a ser investigado após um caso em que 
foi vítima de extorsão, em 2017. Segundo o MP, o pároco 
foi pressionado a pagar pessoas que faziam chantagem 
“para que não divulgassem imagens e mensagens 
eletrônicas com informações pessoais, amorosas e
 profissionais que levassem a prejudicar sua imagem”.

Na ocasião, padre Robson transferiu mais de R$ 2 milhões
 das contas bancárias da Afipe para os criminosos. 
A quadrilha foi condenada em 2019, mas o uso do dinheiro 
dos donativos para fins pessoais chamou a atenção dos
 promotores. A Afipe sobrevive doações de fiéis para o
 desenvolvimento de atividades de interesse do Santuário
 do Divino Pai Eterno, local situado a 23 km de Goiânia
 e que se tornou destino de romaria de peregrinos católicos.

Alvo principal da Operação Vendilhões, deflagrada na última
 sexta-feira (21), padre Robson é investigado por crimes de 
apropriação indébita, lavagem de dinheiro, falsificação de 
documentos, sonegação fiscal e associação criminosa.
 A Igreja Católica afastou o pároco de todas as atividades
 como sacerdote.

Por Época Globo
Publicada por F@F em 27.08.2020

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